sábado, 24 de maio de 2008

matéria - DO OUTRO LADO MORA A POESIA


DO OUTRO LADO MORA A POESIA

Sarau da Cooperifa se destaca como quilombo cultural com lançamento de mais três livros e a produção de um documentário


Por Izabela Vasconcelos

“Povo lindo, povo inteligente, é tudo nosso!”. É assim que começa o Sarau da Cooperifa. Sérgio Vaz, idealizador do programa, abre o sarau com essas palavras e centenas de pessoas as repetem. Muitas palmas, muita energia. Atrás do palco a frase: “O silêncio é uma prece”, e é assim que acontece há seis anos, na periferia da zona sul de São Paulo, a noite que reverencia a poesia.

A Cooperifa, Cooperativa de Poesia da Periferia, já lançou 36 livros e um CD com poesias de 26 autores, lançado em 2006 na Pinacoteca do Estado, na 2ª Virada Cultural. Além disso, se prepara para mais três lançamentos. Para o próximo mês o livro: Cooperifa, quilombo da poesia, pela coleção Tramas Urbanas da editora Aeroplano, e o documentário sobre o Sarau, produzido pela DGT Filmes, previsto para o final deste ano.

O livro, produzido por Sérgio Vaz, reúne 40 autores e 80 poemas e deve ser lançado em julho. “O livro começa na periferia dos anos 70, onde praticamente vivíamos numa ilha chamada Piraporinha, e que quando íamos ao centro, a gente falava: 'eu fui na cidade'”, conta Vaz. Outra produção, o livro Rastilho da Pólvora 2, também do idealizador da Cooperifa, deverá ser lançado entre junho e julho.

Márcio Batista é um dos organizadores do sarau e também irá lançar um livro em junho, o “Meninos do Brasil”, produção independente. Para ele, a noite poética tem um papel muito importante na periferia.“O sarau representa uma mudança muito grande na perspectiva de vida e na comunidade. Nós não temos idéia de quantas pessoas o sarau atinge, mas tudo isso é muito gratificante”, afirma.

É no Bar Zé Batidão, do proprietário José Cláudio Rosa, que tudo acontece, são duas horas de poesia, o silêncio só é quebrado pelas palmas calorosas do público ao final de cada poesia. Há dias em que o Sarau, que acontece todas as quartas-feiras, a partir das oito e meia da noite, chega a reunir 400 pessoas. O sarau já quebrou fronteiras, pessoas de várias zonas da cidade, e até de outros estados, vêm conferir a noite de poesia.

A Cooperifa surgiu como um movimento cultural da periferia em uma fábrica abandonada em Taboão da Serra, o sarau veio bem depois. “Logo quando a fábrica, onde a Cooperifa nasceu, fechou, eu e o Marco Pezão fomos conversar com o dono de um bar chamado Garajão, em Taboão da Serra, para a gente se reunir às quartas-feira para falar e ouvir poesia. Nem a gente sabia direito o que era sarau, mas o movimento foi crescendo e aí virou esse monstro que aí está”, explica Vaz.

Estudantes, mecânicos, professores, vigilantes, jovens, adultos e idosos recitam seus poemas. Basta colocar o nome no caderninho. Os assuntos são os mais variados: vida, alienação, fome, cotidiano, racismo, preconceito, entre outros. A maioria escreve suas próprias poesias, alguns decoram e recitam poemas como “Navio Negreiro”, de Castro Alves, ou “Perguntas de um trabalhador que lê”, de Bertold Brecht. A dramatização também faz parte dos recitais.

Personagens e poemas
Maria de Lourdes Peixoto, conhecida como “De Lourdes”, freqüenta o sarau há três anos. Logo que terminou a faculdade de letras, passou a freqüentar o programa e a recitar suas poesias. “O sarau é como um ritual, é uma igreja pra mim. Lá eu vou até doente”, diz ela.

Dona Edith, como é conhecida Edith Marques da Silva, perdeu a visão há oito anos por conta de uma diabetes, agora, com 63, diz que tem mais facilidade para decorar, é assim que ela recita longos poemas de Castro Alves, Cora Coralina e Cecília Meirelles. As sobrinhas, suas aliadas, gravam os poemas em fitas para que ela possa decorar. “Eu me sinto muito bem no sarau, eu sempre gostei de ler, eu adoro poesia”, afirma ela.

“Mulheres, preparem-se”, é assim que Lourival Rodrigues da Silva, ou "Seu Lourival", como é conhecido, é anunciado para recitar. Ele chega com seu papel e começa a declamar poemas românticos mesclados de humor e com um dialeto que ele próprio criou. Tudo isso faz dele uma marca registrada no sarau.

Edmauro de Almeida, o "Cocão", conheceu o sarau através de um amigo, a partir daí não parou de freqüentar. Hoje, escreve poesias, rap e é um dos integrantes do grupo Versão Popular, que faz apresentações de rap em diversas comunidades e centros culturais da capital. Cocão também participou do livro “Rastilho de Pólvora” e de um CD que reuniu poemas de vários autores da Cooperifa.

No final de 2007 a Cooperifa realizou a 1º Semana de Arte Moderna da Periferia, com direito ao Manisfesto da Antropofagia Periférica, escrito por Sérgio Vaz, apresentações musicais, debates e poesia.

Além do sarau, a Cooperifa participa da Poesia de Ruas, evento de rap que acontece toda última quinta-feira do mês na sede da ONG Ação Educativa. Sérgio Vaz também realiza oficinas de poesia em diversas escolas públicas. Este ano a Cooperifa também foi convidada para participar da Virada Cultural. Sérgio Vaz, Cocão, Márcio Batista, Lu Souza, José Neto, Rose, Fuzzil, Casulo, João Santos, Walmir Viera e Jairo Periafricania, passaram por três palcos do evento. É a periferia mostrando a sua cara.

domingo, 11 de maio de 2008

Sarau da Cooperifa - talento e poesia


Na última quarta-feira fomos no Sarau da Cooperifa. Foi ótimo. Quanta energia, quanto talento. Pessoas de todas as idades freqüentam e recitam seus poemas. Falam sobre a vida, alienação, fome, cotidiano, racismo, preconceito, entre outros assuntos.
A Cooperifa irá lançar sua 2ª antologia, o livro reúne 40 autores e 80 poemas. Um documentário também está a caminho. É a periferia fazendo arte e mostrando que talento e pensamento estão em ação. O Sarau já é uma pauta para o Voz da Periferia, é só esperar.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Periferia ganha espaço na TV Cultura


Olha só que notícia boa! A nova programação da TV Cultura abriu espaço para a periferia. O programa Manos e Minas estréia no dia 07/05 às 19:30. É só conferir. Veja a reportagem que saiu no O Estado de S. Paulo.


A hora e a vez dos Manos e Minas

Com apresentação de Rappin Hood, estréia dia 7 na Cultura o primeiro programa feito por, e para, jovens das periferias

Flávia Guerra

'Satisfação! Só os aliado, só os companheiro' , brada o rap do mestre-de-cerimônias da noite. E os aliados devolvem o verso: 'Us guerreiro! Us guerreiro.'Na platéia do Manos e Minas, o clima é 'mil grau'. Vários manos, atitude, responsa, Zona Sul, Zona Norte, Zona Oeste, e, claro, 'Zona Leste somos nós'. A animação é total enquanto Rappin Hood conduz a galera, que samba ao som de Jorge Aragão (tem samba, sim, sinhô) e cala em solidariedade quando o assunto é a falta de trabalho na periferia. Na tela, um jovem rapper fala do drama de procurar emprego - enquanto distribui currículos, faz seu rap. Na platéia, depois de assistir ao vídeo, um ex-presidiário solta o verbo: 'Fui enquadrado no artigo 157. Cumpri minha pena. Tô livre e quero trabalhar. Mas quem vai dar emprego para um ex-presidiário?' Jorge Aragão quebra o silêncio solene: 'Quem quiser trabalhar comigo procure minha equipe. Tem vaga para ajudante geral na turnê que estou fazendo. Não é muito, mas é um começo.'

Assim foi dada a largada de Manos e Minas, que estréia na TV Cultura no dia 7, às 19h30, e promete fazer jus ao bordão 'tá tudo dominado'. Mas, afinal, o que é Manos e Minas? Com exclusividade, fomos acompanhar a primeira gravação.

Programa de auditório? Show? Jornalismo? É tudo ao mesmo tempo - e agora. É o primeiro programa da TV nacional que não é só pensado mas também produzido pelo morador da periferia. 'Não é show. A vybe aqui é diferente. Na TV, você troca energia com o público, mas nunca sabe como vai voltar. Está sendo ótimo. O pessoal troca idéia legal. É o espaço que faltava. Até hoje, quase sempre, quando falam de nós, é só na página policial', reflete Rappin Hood. Em Manos e Minas, ele é mais que apresentador. É mestre-de-cerimônias. 'Não tem personagem. Sou eu mesmo', brada ele, que fez sua estréia na TV em 2007 no quadro Mano a Mano, do Metrópolis, em que fazia reportagens sobre temas da cena periférica de São Paulo. 'No Metrópolis, era mais concentrado na cultura. Fomos formatando uma linguagem e amadurecemos a idéia de criar um programa novo', comenta o diretor artístico de Manos e Minas, Ricardo Elias.

Mas quem manda na pauta da periferia? Um coletivo criativo formado pelo diretor do Núcleo de Cultura e Arte Hélio Goldstein, pelo editor-chefe Ramiro Zwetsch, o diretor de cena Dinho e por Elias. O motorista do 'busão' cultural é Rappin Hood.Por falar em coletivo, um dos destaques do programa é o quadro Buzão - Circular Periférico. Já tradicional das quebradas, o Buzão é conduzido pelo agitador cultural Alessandro Buzo, que percorre em um ônibus os caminhos da periferia do Brasil. Para completar o time, a DJ Juju Denden faz reportagens com o toque das minas sobre assuntos diversos. Cabelo afro, comida de porta de estádio e, claro, moda. O escritor Ferrez fala da cena cultural que pulsa nas quebradas. Rappin também vai a campo em busca de reportagens sobre esporte e comportamento. E arremata: 'Satisfação! Tamo junto!'